“Chega! Basta! Não vamos aceitar que matem nosso presente nem continuem a assassinar nosso futuro.” Essa foi uma das várias frases de efeito do midiático discurso em que o presidente Michel Temer (PMDB) anunciou a intervenção federal no Rio de Janeiro para combater a criminalidade, nesta sexta-feira (16), no Palácio do Planalto. Ele quis parecer que falava em nome de todos os brasileiros. Mas, na verdade, o “nós” do presidente se refere a um grupo bem menor: o do próprio Temer.
É o presente e o futuro do presidente e de seus aliados que estão com um pé e meio enterrados na cova. A intervenção é apenas a pá verde-oliva com que vão tentar tirar um pouco da lama que os recobre. Ela até pode ser um paliativo. Mas não é solução definitiva para o Rio. Tampouco para o país. Só para Temer, em seu sonho (ou seria delírio) de se reeleger. Ou, mais realisticamente, de colocar no Planalto um braço-direito a partir de 2019.
Anúncio da intervenção não teve conteúdo, mas a embalagem foi bem cuidada
Aos fatos. A intervenção não faz parte de um plano de segurança bem pensado – o que por si só já coloca em dúvida sua eficácia. Foi decidida às pressas. O governo nem mesmo soube explicar em detalhes como o combate ao crime vai funcionar no Rio daqui para frente.
Mas, se não havia conteúdo, a embalagem foi bem cuidada. Temer chamou um marqueteiro para medir suas palavras no anúncio. E elas faziam clara referência ao slogan de seu governo: “Ordem e Progresso”.
“Nós que resgatamos o progresso e retiramos o país da pior recessão da história, agora vamos restabelecer a ordem”, disse o presidente em solenidade no Planalto. Depois, foi à TV anunciar ao país inteiro a intervenção que ninguém soube explicar como vai ser exatamente.
Detalhe importante: Exército já estava nas ruas e pouco muda com a intervenção
Outro detalhe importantíssimo: o Exército já está autorizado a ir para as ruas do Rio desde julho de 2017, quando o próprio Temer editou um decreto de garantia da lei e ordem autorizando o uso das Forças Armadas no combate à criminalidade no estado. E, de acordo com essa medida, os militares poderiam atuar no patrulhamento até dezembro de 2018, a mesma data da validade da nova medida.
A intervenção federal muda pouco em relação ao decreto que já estava em vigência. A grande diferença é que, antes, o comando das operações de combate ao crime era dividido entre o Exército e o governo do Rio. Agora, só os militares mandam.
Mas é pouco provável que isso tenha efeitos positivos de longo prazo. Afinal, há muitas instituições de segurança pública no país para serem integradas: PM, Polícia Civil, Polícia Federal, polícias rodoviárias (estadual e federal) – e, agora, as Forças Armadas. Elas até podem agir conjuntamente de modo eficiente em algumas operações pontuais e com prazo determinado: Copa do Mundo, Olimpíada, grandes eventos. Mas o dia a dia do país insiste em mostrar que os órgãos de combate à criminalidade batem cabeça a todo momento.
Não será um general ou um punhado de tanques nas esquinas que vão mudar isso. Contudo, eles podem ser úteis para lustrar a imagem de um governo desgastado.